Croquis Bordados de Ronaldo Fraga
Em seu segundo desfile inspirado na literatura brasileira, Ronaldo Fraga não deixou a desejar em nenhum ponto. Ainda mais deslumbrante que o primeiro, inspirado em Carlos Drummond de Andrade, no inverno 2005 (http://chic.ig.com.br/materias/344501-345000/344876/344876_1.html ou entre na coleção “todo mundo e ninguém” no site de Ronaldo Fraga: http://www.ronaldofraga.com.br). Nesse desfile do verão 2007, Ronaldo traz às passarelas as cores do sertão, descritas por Guimarães Rosa em o “Grande Sertão Veredas”, dirigido exemplarmente por Roberta Mazola, produtora da “São Paulo Fashion Week”.
Para concretizar o espetáculo de cores e vida, Ronaldo juntou-se a ninguém menos que Rodrigo Câmara, talentosíssimo fotógrafo e artista plástico carioca que possui um estúdio no charmoso bairro de Santa Tereza, onde desenvolve produções fotográficas nos ramos da publicidade, jornalismo e moda. Depois de 16 horas de trabalho, Rodrigo e sua equipe montaram a passarela e cenário com serragens coloridas para formar o desenho de uma cobra enrolada num chão de bichos, flores, caveiras e estrelas. O desfile, inclusive, fez parte das comemorações ao cinquentenário da obra de Guimarães e inspiração do desfile: Grande Sertão Veredas.
Para recriar o universo de Guimarães, nesse desfile, batizado de “A cobra: ri”, Ronaldo usou elementos que remetem à beleza do sertão: pássaros, azuis, beges, folhas, estrelas e lua do céu do sertão em muitos bordados em camisas, vestidos com aplicações lindíssimas, volumes e batas. As criações de Ronaldo dizem muito, traduzem sentimentos e emocionaram a platéia do São Paulo Fashion Week e, mesmo assim, são totalmente urbanas e “usáveis”, sem deixar o conceito de lado.
Segundo Ronaldo, apesar do universo de Guimarães ser seco, não existe a necessidade do desperdício de detalhes, beirando o limpo. A coleção fala do sertão, que embora seja um universo seco, cheio de armadilhas, é também cheio de cores, cheiros e texturas (http://chic.ig.com.br/materias/377501-378000/377732/377732_1.html).
Na maioria de seus desfiles, Ronaldo não dá nenhum detalhe antes de seu espetáculo acontecer, o que gera um incrível sentimento de inquietação e ansiedade da parte do público, já que as pessoas vão sem esperar o que vai acontecer. A experiência estética gerada pelo desfile de Ronaldo é tão grande que entra no campo da finalidade, ultrapassando o fim, levando a uma relação mais pessoal e especial do público com suas criações. O público primeiro sente suas criações e sua mensagem, depois conceitua, ao invés de criar expectativas a respeito de um tema antes do desfile. A imaginação flui, tornando as obras de Ronaldo possuidoras de uma beleza quase livre. Quando uma pessoa vê um desfile de Ronaldo, a primeira idéia que passa por sua cabeça é mostrá-la para alguém próximo, para que compartilhe esse sentimento de deslumbre e emoção.
Nessa coleção, os vestidos são curtos com os joelhos à mostra e os decotes profundos. Os tecidos são bases de algodão, malhas “stonadas”, crepes e cambraia sedosa, com desenhos de bichos, como cobras, tamanduás e cabeças de gado, além de buritis. A silhueta é afastada do corpo, volumosa, e a peça chave é o vestido, inclusive sobreposto a bermudas, shorts, calças e saias. A cartela de cores é dividida em três: cores do amanhecer (branco, amarelo, cor de giz, encardidos e pálidos), cores do dia (vermelho, verde-água, laranja e terra) e cores da noite (azul-marinho, turquesa e charuto). Nas estampas, cobras e flores.
A maquiagem marca bastante as maçãs do rosto, dando um efeito queimado pelo sol do sertão. Os cabelos são desgrenhados e presos, porém com vários enfeites verdes brancos e vermelhos.
A combinação de bata com bermuda, levemente cobrindo o joelho, com bolso mais estruturado e acompanhado de lapela, aparece muito. Nas blusas, o recorte redondo na parte de cima das costas, enfeitado com uma gola como as das roupas de criança, aparece em vários dos modelos, sempre soltinhos. Brilhos localizados também aparecem na coleção, que mistura estampas no look e é apresentada em blocos coordenados por cor, seguindo o enredo do tema. Ronaldo quis juntar o erudito com o popular nessa coleção.
"Viver é um negócio perigoso" foi a frase que deu início ao desfile, sobre o fundo musical. Esta frase, que se repete diversas vezes ao longo do livro, tema da coleção, foi uma frase conceito para coleção de Ronaldo, sem dúvidas. Durante todo o desfile, trechos da obra de Guimarães são citados e, por fim, o segredo do personagem Diadorim é revelado, levando ao fim do desfile. Ronaldo aparece logo em seguida, arremessando livros de Guimarães Rosa para a plateia. Para fechar com chave de ouro, as peças desenvolvidas foram leiloadas e o valor arrecadado revertido em fundos para ações no Museu Guimarães Rosa, em Cordisburgo (município de Minas Gerais, terra natal de Guimarães Rosa).
"Mire e veja: o mais importante e bonito, do mundo é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas - mas que elas vão sempre mudando".(Guimarães Rosa)
Ficha:
Cores: Amarelo, giz, argila, salmão, rosa, verde-água - desbotados pelo sol da manhã
Vermelho e laranja- iluminados pelo dia
Marinho, turquesa, charuto - molhados pelo sereno da noite
Tecidos: muito algodão, crepe, malha, sarja e cambraia sedosa.
Formas: soltas e voadoras
Sapatos: masculinos são Jaílson Marcos, femininos Feng
Direção do desfile: Roberta Mazola
Cenografia: Rodrigo Câmara
Trilha: Ronaldo Gino
Beleza: Cida nogueira e equipe com produtos Sebastian
Assessoria de imprensa: na mídia
Design gráfico: desiglandia
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